Chacrinha, Silvio Santos, Xuxa e o próximo prefeito

Por Zé Peixoto

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14/05/2024

Zé Peixoto

Cineasta e produtor cultural

Como em qualquer programa de auditório, nossa atual campanha eleitoral para prefeitos e vereadores, deve vir recheada por um repertório completo de recursos mediáticos. Já se foi o tempo da troca do voto por dentadura. Ficou para trás, a política do voto a prazo, com a entrada só de metade de uma cédula de dinheiro, ou de apenas o pé direito de um sapato, com o acerto da outra parte, só depois do tal voto consumado no cabresto. Evoluímos como nação.  Hoje, sob a vigilância dos mecanismos de controle eleitoral, a barganha pelo voto do eleitor abduzido, vem com gosto de silício de microchip, e enquadrado pela tela do celular. Afinal, o Brasil já entrou para o futuro, galgamos pontuações entre os líderes mundiais, e abandonamos o papel de párias na comunidade internacional.   

Como no mundo da política já se foi o tempo ingênuo e pueril, em que jogar bacalhau na plateia, lançar aviõezinhos com dinheiro, ou descer de espaçonaves, divertia multidões de brasileiros, nos programas de TV aos domingos, ou nas sessões da tarde.  Ao longo de décadas, dando sustentação ao falso milagre brasileiro, esses foram alguns dos códigos reverenciados por milhões de telespectadores, hipnotizados pelo poder dos programas de auditório. Como esquecer de Chacrinha, conhecido como o “Velho Guerreiro” da buzina, com seu humor ácido nos programas de calouro, Silvio Santos, reverenciado por ter saído do nada como camelô, e fazer fortuna, vendendo capinhas plásticas de título de eleitor, e de Xuxa Meneghel, com sua trajetória meteórica das revistas masculinas aos programas infantis, ao ser mundialmente reconhecida como a Rainha do Baixinhos. Eles e tantas outras marionetes midiáticas de estúdio de televisão, ocupavam nossos corações e mentes, atordoadas pela falsa promessa do “pra frente Brasil! ”.      

Nas próximas eleições municipais, ficaremos absorvidos por uma democracia pulverizada entre o viés divino da extrema direita, o centralismo das sociedades secretas e o neo-coronelismo de esquerda, fundidos ao brilho transgressor do arco-íris, à benevolência da cesta básica de xepa, e até à estética gráfica da pele. Tudo isso, deverá ser bem misturado por um triturador comprado na Shopee, e depois ficar em fogo brando. Assim, o que era uma sopa de contrastes, será reduzida ao substrato surrealista da plena cidadania banguela. Sim! É pouco dizer que entramos na era das fake News, e que nossa responsabilidade como cidadãos é vigiar a transparência e a veracidade dos fatos. A verdade virou um ponto fora da curva, sem nenhuma força de resistência, frente a um mar de promessas vazias, e sem qualquer compromisso com a realidade. Esse é o nosso Brasil, o pais do carnaval e do futebol, a terra da igualdade sem vergonha.    

Nos próximos meses, provavelmente seremos massacrados por mapas milagrosos de acesso ao paraíso.  Cada um ao seu estilo, desenhará um vasto menu de paradas de beira de estrada, para reabastecer o transporte, ou poder forrar o estômago com alguma refeição impregnada de carboidratos e óleos saturados, bem ao estilo dos movimentos populistas hoje em vigor.  Nesse mapa, também estarão sinalizados alguns atalhos, para que mesmo fora das autoestradas do desenvolvimento e da civilização, possamos ter acesso a atalhos que burlem o caminho da legalidade, e abram uma via direta ao clientelismo, ao oportunismo de plantão, e as barganhas típicas do equilíbrio de forças no executivo, legislativo e judiciário. Em suma, estamos em rota de colisão com a eterna promessa de que o Brasil é o pais do futuro, e de que vivemos em uma terra abençoada, onde não existem sequer tragédias naturais. Oxalá, na data prevista para as próximas eleições, não haja um eclipse total fora do curso da astronomia, um meteoro do tamanho do estádio do Maracanã caia sobre o Brasil, ou as mudanças climáticas provoquem um dilúvio ou um tsunami.  Já começamos a ouvir pelas esquinas do bairro, e nas mesas de botequim da cidade, que já estão fazendo cópias pirata da Discoteca do Chacrinha, do slogan “Silvio Santos Vem Aí”, e dos figurinos do Xou da Xuxa, como brindes saudosistas do tempo em que ainda acreditávamos que eramos felizes. Tenho um vizinho que ainda tem em casa uma tv de tubo, e um eletricista que sabe como montar antenas improvisadas, para conexões clandestinas da StraLink, do Elon Musk.  Devemos tentar tudo o que for possível, porque nada vale mais que a diversão.

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