A liberdade de expressão é tema que, ao longo da história do Brasil, sempre trouxe discussões e impasses. Apesar de ter sido garantida nas primeiras Constituições, a possibilidade de se expressar dos cidadãos sofreu longos períodos de censura em nosso país, como a Era Vargas, na década de 30 e a ditadura militar, que perdurou entre as décadas de 60 e 80.
Com a promulgação da Constituição Federal de 1988 e a primavera da redemocratização no Brasil, a liberdade de expressão foi novamente engendrada, nos incisos IV e IX do art. 5º do diploma legal, com a vedação a qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.
Diante isso, tornou-se prerrogativa de todos os brasileiros a possibilidade de expressar suas opiniões, sentimentos e ideias da forma que lhes convir, sem qualquer controle prévio ou censura, como, por muito tempo, foi a realidade no país.
No entanto, apesar de ser considerado um direito fundamental, o assunto ainda hoje traz desdobramentos, principalmente quando se contrapõe a liberdade de expressão e a necessária ética nas relações humanas. Nessa discussão, questiona-se: é possível uma ordem social em que os dois fatores coexistam pacificamente?
Ora, a globalização causou no mundo uma disrupção frente àquilo que se conhecia como a ordem natural das coisas. Distâncias foram encurtadas e a comunicação ao redor do mundo tornou-se de extrema rapidez e facilidade, o que conferiu à mídia um papel chave na formação do conhecimento e da opinião de pessoas nos mais diversos pontos do planeta.
Com isso, o conhecimento e as diferentes opiniões puderam ser divulgados através do rádio, televisão e cinema, que passaram a ser veículos para distintos públicos, com diferentes ideologias, de forma a enriquecer os debates sociais.
Nesse contexto, em 2009, foi declarada a inconstitucionalidade da Lei nº 5.250, popularmente conhecida como Lei de Imprensa, pelo Supremo Tribunal Federal, tendo em vista sua ótica punitiva e cerceadora da livre manifestação.
Com a declaração da inconstitucionalidade da lei, o direito de resposta restou regulamentado pelo próprio texto da Constituição Federal, que determina, no inciso V do artigo 5º, que “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”.
Diante dos inegáveis pontos positivos engendrados com o advento da sociedade nformacional, pode-se dizer que a liberdade de expressão se tornou cada vez mais exercitada, suprimindo, todavia, por ocasiões, o direito à privacidade e à intimidade.
Em 2011, a aparente antinomia foi palco de discussões públicas e jurídicas no Brasil, quando a atriz global Carolina Dieckmann teve o seu computador invadido por um grupo de hackers que divulgaram, sem autorização e após ameaças e extorsões, mais de trinta imagens íntimas da autora, através das redes sociais. O episódio, foi, inclusive, pretexto para a promulgação da Lei nº 12.737/2012, que tipifica criminalmente os delitos informáticos, alterando o Código Penal, e, até hoje, mais de dez anos após o ocorrido, é considerada a principal ferramenta legal para a segurança virtual no Brasil.
À época, as imagens da atriz foram compartilhadas pelos mais diversos veículos de mídia, escancarando a confusão entre os limites do público e o privado, e principalmente, a ofensa ao direito à privacidade da atriz.
O cenário atual não é de todo distinto: o que se vê nas redes sociais é grande parte dos internautas fazendo o uso da “máscara” por trás das telas para ofender e legitimar a violência contra outras pessoas, em nome da liberdade de expressão. O pensador francês Voltaire afirmou “posso não concordar com nenhuma das palavras que você disser, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-las”. Entretanto, a experiência do mundo globalizado revela que a moralidade e o respeito devem ser balizas de tal defesa.
Por isso, que defendamos e protejamos a livre expressão, como meio de viabilização do debate social, da construção da cultura humana e, principalmente do fortalecimento da democracia, através da estrita observação à dignidade da pessoa humana, para que a ética e a liberdade de expressão possam conviver em harmonia.