As refeições em família são um hábito cada vez mais difícil de manter na vida moderna. A correria do dia a dia, o excesso de trabalho dos pais e de lição de casa ou atividades extracurriculares dos filhos fazem com que reunir todos à mesa seja algo feito apenas em ocasiões especiais. Para piorar, até mesmo nestes casos, as pessoas raramente estão totalmente presentes. Há o celular, o tablet, a televisão, entre outras distrações tecnológicas. Entretanto, um número crescente de estudos confirma a importância das refeições não só para crianças, mas também para os adultos.
Uma pesquisa feita pela American Heart Association (AHA) com mil adultos nos Estados Unidos revelou que fazer refeições regulares em família pode ajudar a diminuir o estresse. Para 91% dos pais, sua família fica menos estressada quando compartilha refeições. Além disso, 65% disseram estar pelo menos um pouco estressados e 27%, muito ou extremamente estressados.
O estresse constante está entre os grandes inimigos da saúde. No longo prazo, há aumento do risco de doenças cardíacas e acidente vascular cerebral.
— O estresse crônico favorece a elevação da pressão arterial, a aceleração da frequência cardíaca e o aumento dos níveis de gorduras e açúcar no sangue, contribuindo para hipertensão, diabetes e doenças cardiovasculares. Além disso, o estresse crônico provoca a excreção de fosfato em níveis fora do padrão, o que prejudica a função renal, além de levar a fraqueza muscular e alterações na composição óssea — diz a médica Caroline Reigada, especialista em nefrologia pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
A AHA não detalha os mecanismos que explicam essa associação benéfica entre as refeições em família e a redução do estresse, mas estudos anteriores e especialistas afirmam que o principal “culpado” desses benefícios é o fortalecimento da conexão e dos laços familiares que esse momento propicia.
— Quando se fala em reduzir o estresse, geralmente as atividades como meditação, ioga e lazer são lembradas. Mas as refeições, desde o momento do preparo até o momento do consumo alimentar, particularmente se forem compartilhadas com pessoas com laços afetivos, como os familiares, podem reduzir o estresse. O ato de cozinhar e fazer refeições em família pode representar conforto emocional, diversão e ao mesmo tempo leva a uma dieta mais equilibrada, crucial para a saúde mental — avalia a nutróloga Marcella Garcez, diretora e professora da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran).
Saúde física e emocional para adultos e também para crianças
Estudo feito pela Universidade de Illinois mostrou que crianças que sentam à mesa para comer com os pais têm melhores hábitos alimentares, com maior maior consumo de frutas, legumes e verduras e menos doces e bebidas açucaradas.
— As refeições em família favorecem a construção de um hábito alimentar saudável, em especial em crianças. Mas para isso, é preciso que os pais deem o exemplo. Quando pais e filhos sentam à mesa e a criança vê o adulto comendo um prato saudável, aquilo se torna um modelo para ela e naturalmente, ela tenderá a segui-lo — afirma a nutricionista Priscilla Primi.
A nutróloga Marcella Garcez complementa que um hábito alimentar saudável melhora os níveis de neurotransmissores como a serotonina, o que pode ajudar a aliviar sintomas de depressão, ansiedade e estresse.
Outro estudo, da Universidade Harvard, que analisou 15 anos de pesquisas sobre refeições familiares, mostrou que os benefícios vão muito além dos hábitos saudáveis. Crianças que jantam regularmente em família têm menor risco de obesidade na infância e na idade adulta, ingerem menos calorias do que se estivessem comendo fora de casa, apresentam taxas menores de uso de drogas e de depressão, são mais resilientes e têm melhor desempenho acadêmico, vocabulário mais amplo e maior capacidade de leitura.
De acordo com trabalho publicado no Journal of Developmental & Behavioral Pediatrics, crianças que fazem refeições em família com frequência aos 6 anos têm melhores aptidões gerais, menor consumo de refrigerantes, menores tendências a agressões físicas e comportamento opositivo aos 10 anos. Mais refeições em família também estão fortemente associadas a bom humor e visão positiva do futuro em adolescentes.
Em todos esses estudos, o efeito benéfico da alimentação compartilhada está associado à criação e ao fortalecimento de laços e conexões familiares.
— Tanto crianças como adultos tendem a sofrer menos estresse, além de cultivarem um melhor relacionamento, devido à conexão estabelecida nessas ocasiões. As evidências científicas são cada vez mais robustas — afirma Garcez.