Durante chuva com raios, a regra é clara: se estiver dentro de um carro, mantenha os vidros fechados e não entre em contato com as partes metálicas do veículo. A orientação é dada por autoridades e especialistas e encontra explicação na ciência: trata-se do princípio da Gaiola de Faraday.
Durante a chuva que atingiu a cidade de São Paulo nesta terça-feira (9), um homem de 62 anos morreu após sair do seu carro atingido por um cabo da rede elétrica que se rompeu. A mulher que estava com ele, de 60 anos, não saiu do veículo, e foi socorrida sem ferimentos (leia mais abaixo).
Segundo um documento elaborado pelo Instituto de Física da USP de São Carlos (IFSC), “quando uma casca esférica condutora é carregada, toda a carga fica concentrada na superfície externa, e o campo elétrico dentro da casca é nulo. A região interna é completamente livre de influências elétricas externas”.
Exemplificando: quando um carro — a gaiola — é atingido por raios ou qualquer tipo de descarga elétrica de alta intensidade, essa energia fica acumulada na parte externa do veículo; internamente, não há perigo se a pessoa não tocar as partes metálicas.
O princípio recebeu esse nome porque, em 1836, o físico britânico Michael Faraday construiu uma gaiola para demonstrar na prática a teoria.
O professor Antonio Martins Figueiredo Neto, do Instituto de Física da USP de SP, explicou em reportagem do g1 sobre o tema, que a corrente elétrica só existe se houver um diferencial: “É o caso de a pessoa pisar no chão, porque a terra está a um potencial diferente do carro e, assim, fecha o circuito, gerando a descarga elétrica.”
“Pode ocorrer de uma corrente passar pelo carro se os pneus entrarem em contato com água com sal (íons) ou metais”, completa. Por isso, a recomendação de, mesmo dentro do carro, não tocar as partes metálicas.
Cena da Gaiola de Faraday no filme ‘O Aprendiz de Feiticeiro’ — Foto: Reprodução/Filme ‘O Aprendiz de Feiticeiro’
Como ficar seguro em dias de tempestade
A Defesa Civil do Estado de São Paulo lista uma série de dicas de segurança para adotar em dias de tempestade com raios:
Evite lugares abertos, como estacionamentos, praias e campos de futebol;
Abrigue-se em casa, edifício ou em instalação subterrânea, como o Metrô;
Se estiver no carro, mantenha os vidros fechados, sem contato com as partes metálicas do veículo;
Caso não encontre um abrigo por perto, fique agachado com os pés juntos, curvado para frente, colocando as mãos nos joelhos e a cabeça entre eles até a tempestade passar;
Mantenha distância de objetos altos e isolados, como árvores, postes, quiosques, caixas d’água, bem como de objetos metálicos grandes e expostos, como tratores, escadas e cercas de arame;
Evite soltar pipas, carregar objetos, como canos e varas de pesca e andar de bicicleta, motocicleta ou a cavalo;
Mantenha distância de aparelhos e objetos ligados à rede elétrica, como TVs, geladeiras e fogões;
Fique afastado de janelas, tomadas, torneiras e canos elétricos;
Evite tomar banho durante a tempestade.
Homem de 62 anos morreu
Nesta terça-feira (9), um homem de 62 anos foi eletrocutado após ser atingido por um cabo energizado na Rua Pedro de Toledo, em Moema, Zona Sul da capital.
Uma árvore caiu sobre o cabo da rede elétrica, que atingiu o carro onde estava o homem. Pessoas que acompanhavam a cena pediram para que ele não saísse do veículo, mas ele deixou o carro e foi atingido pela descarga elétrica.
O motoboy Robson Oliveira dos Santos testemunhou o momento em que o homem foi atingido pelo cabo em São Paulo.
“Chamei o bombeiro do hospital para tentar ajudar os dois [que estavam no carro], só que, quando a gente chegou, o bombeiro pediu bastante para ele não sair do carro. Aí ele saiu. Eu estava pedindo para ela não sair também, e a gente conseguiu que ela não saísse. Aí falei para ele: ‘Pega o extintor, vamos jogando no carro para não pegar fogo no carro”. Deu certo, mas infelizmente [houve] uma vítima”.
E completa: “Ele saiu logo, aí o cabo energizou. Na hora, ele caiu duro, não deu nem tempo. Tinha muito fogo aqui, aí o cabo caiu, estava tudo energizado”.
A vendedora ambulante Maria de Lourdes diz ter percebido o medo do motorista. “Estourou ali e pegou fogo, dando aqueles pipoco, aí o fio quebrou e enrolou no carro dele. Ele deu ré. Quando ele deu ré, ele não poderia sair mais. Mas ele ficou com medo. Nós falamos assim: ‘Corre, corre, chega mais para lá!’. Mas não tinha como.”
De acordo com informações do Corpo de Bombeiros, quatro viaturas atuaram no atendimento. Uma mulher que também estava no carro não deixou o veículo e não morreu. Ela foi levada ao Hospital do Servidor consciente. O caso foi registrado como morte suspeita pelo 27º DP, que requisitou perícia.
Estragos causados na cidade
Perto da Rodoviária do Tietê, na Zona Norte, uma estrutura metálica despencou do prédio do Arquivo Público do Estado de São Paulo e atingiu a fiação, deixando o entorno sem energia.
O vento passou de 90 km/h na região do Aeroporto do Campo de Marte.
Estrutura metálica do prédio do Arquivo do Estado cai perto de banca próxima à Rodoviária do Tietê — Foto: Gladston Angelo da Costa/Arquivo Pessoal
Imagens registradas no Vale do Anhangabaú mostram uma ventania intensa na região central. A rua José Paulino, no Bom Retiro, ficou alagada.
Uma árvore de grande porte caiu na Rua Abílio Soares, no Paraíso, e atingiu dois carros. Em Moema, o alagamento deixou a Alameda dos Jamaris, entre a Alameda Iraê e Avenida Ibirapuera, intransitável.
A Avenida 23 de Maio também ficou intransitável, nos dois sentidos, na altura do Viaduto General Euclides de Figueiredo (região do Ibirapuera).
Na Zona Leste, a Avenida Celso Garcia também ficou alagada. Na Zona Norte, o hangar da PM no Aeroporto Campo de Marte foi destelhado.
Segundo a Defesa Civil, até as 18h, foram registrados 132 chamados para queda de árvores e um chamado para desabamento/desmoronamento.
Fachada do Arquivo Público do Estado de São Paulo fica com buraco após queda de estrutura metálica — Foto: Gladston Angelo da Costa/Arquivo Pessoal
Calor
A estação automática do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) no Mirante de Santana, Zona Norte de São Paulo, chegou a registrar 34,1°C nesta tarde, mesmo valor que registrava na segunda-feira (8), quando uma chuva intensa caiu sobre a capital.
Árvore cai na Rua Abílio Soares, Paraíso — Foto: Arquivo pessoal
Os ventos de até 77 km/h resultaram na queda de 200 árvores e deixaram diversos bairros da cidade sem energia elétrica.