O Adenilson Junior e a Alana Koslowski deixaram uma vida estável no Brasil e um apartamento próprio pelo sonho de morar em Portugal, em maio do ano passado. O casal fazia parte do grupo de mais de 233 mil brasileiros com residência no país europeu. Diante das dificuldades encontradas com a alta dos preços e o desemprego, os dois, então, decidiram voltar pro Brasil no início do mês.
"Dá um pouco de decepção, só que, quando a gente saiu, a gente saiu assim: pode dar certo, como pode dar errado. A gente só vai saber se a gente for. Só que a gente não se via e trabalhava de domingo a domingo, não tinha folga. Aí a gente começou a analisar: até que ponto isso vale? A gente sobreviver trabalhando assim, longe da nossa família? Porque pesa muito a saudade de pai, mãe, irmãos. Pesa muito. E aí começamos a apanhar na balança: vamos voltar embora que aqui não é para a gente", conta.
Esse movimento de retorno tem se intensificado nos últimos meses. Esse ano, o Programa de Apoio ao Retorno Voluntário e à Reintegração da agência da ONU para migrações recebeu, em média, quatro pedidos de ajuda por dia de brasileiros que queriam deixar Portugal. Entre janeiro e março, foram 363 casos, um número 290% maior do que o registrado no mesmo período de 2022, quando o programa recebeu 125 pedidos de ajuda. Esse ano, 97 pessoas que viviam em Portugal conseguiram voltar ao Brasil.
Para a advogada Deborah Bergman, o problema foi o aumento do aluguel. Quando se mudou para Portugal em 2017 para estudar, ela pagava 350 euros por um quarto num apartamento compartilhado, mas viu o preço disparar, chegando a 600 euros. A solução foi procurar moradia numa região afastada do Centro, porque quase metade do salário dela ia para pagar o aluguel.
"Hoje eu moro em um quarto, em uma zona afastada de Lisboa, e pago 420 euros porque não tenho contrato. O que é um preço excelente, e um chado, dei muita sorte, porque preço de mercado de um quarto é € 650. Um salario mínimo em geral de 700 e poucos euros mal paga um quarto. Num panorama geral, na minha vida, quase não sobra dinheiro por mês. E quando sobra, sobra € 100 porque eu dei uma apertadinha nas contas", afirma.
Deborah, agora, pensa em se mudar para outro país da Europa, onde ela consiga um salário melhor.
"Eu penso sim em sair de Portugal principalmente por conta dos salários, é muito difícil crescer na vida aqui. A única coisa que me prende é a questão do visto. Ainda não tenho visto permanente. Então isso é o que mais me prende aqui. Quando eu tiver o visto de residente, eu penso sim em ir para outros países da Europa onde eu posso ter um salário mais alto, uma condição de vida melhor. E até para poder comprar meu próprio apartamento, estruturar minha vida, porque não vejo essa possibilidade em Portugal".
A empresária Patrícia Lemos é proprietária da consultoria 'Vou Mudar Para Portugal', que presta serviços para brasileiros que querem viver no país. Para ela, é um erro planejar uma mudança para Portugal pensando em ganhar dinheiro, porque o custo de vida por lá vem aumentando, principalmente, por causa dos altos preços do mercado imobiliário.
"Primeiro, é preciso ter planejamento. Dois, propósito. O seu propósito para mudar não pode ser ganhar grana. Para portugal, pelo menos, não pode ser. Voce vai para os Estados Unidos, para N países, até o próprio bBrasil para ganhar dinheiro é muito melhor do que Portugal. A inflação, o custo de vida aumentou significativamente, e o país vive um processo que a gente vê as discursões do governo em relação a esse tema porque é uma dicotomia. O país precisa crescer porque Portugal nao é rico. Precisa crescer e ganhar dinheiro. Então tem incentivo imenso a turismo e imigração. A contrapartida é que é um país pequeno. Pouco produto, muita gente querendo, os preços sobem. Então você tem mercado imobiliário que subiu absurdamente. Ao mesmo tempo, o país precisa do imigrante porque é um país envelhecido. Só que não tem casa para essas pessoas morarem", reforça.
A gestora de equipes Isabela Caetano mora em Portugal desde 2017 e tem planos de voltar pro Brasil ainda esse ano. Ela disse que os salários não acompanham a qualidade de vida que ela imaginava e que, por isso, não compensa mais ficar longe da família.
"O custo de vida em Portugal subiu muito e os salários não acompanham, aquela qualidade de vida que a gente imaginava que teria em 2017, não acompanha. E parece que não compensa o desconforto de morar longe da família", diz.
O Consulado do Brasil em Portugal também recebe pedidos de ajuda de brasileiros querendo retornar, mas a advogada de Imigração Ingrid Barachinni afirma que o governo federal não é obrigado a trazer ninguém de volta. A especialista orienta buscar ajuda com parentes, negociar taxas com empresas aéreas e procurar informações no Consulado.
"A obrigação ele não tem. O Consulado tem outra finalidade que é de emissão de vistos, apoio, em caso de guerra, pessoa em extrema necessidade. No caso da pandemia, vários aviões vieram para o Brasil. Então em casos de calamidade, como problema na Rússia. Agora, uma pessoa em específico não vai ter esse atendimento personalizado, de ir pagando. Senão, vai todo mundo tentar, e depois não dando certo, vai voltar às custas do governo brasileiro. Mas podo ter uma portaria, decreto, que apoie sssas pessoas, por exemplo".
O Itamaraty disse, em nota, que a repatriação é uma medida excepcional de assistência, destinada a pessoas efetivamente necessitadas e em situação de vulnerabilidade.