Levantamento feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e pelo Datafolha aponta que nos últimos 12 meses, 28,9% (18,6 milhões) das mulheres brasileiras relataram ter sido vítima de algum tipo de violência ou agressão, o maior percentual da série histórica.
O mesmo levantamento indica que no ano passado, 35 mulheres foram agredidas por minuto no país. Do total de agressões, apenas 45% foram denunciadas, segundo o estudo.
No Espírito Santo o número de medidas protetivas aumentou 16,38% entre 2021 e 2022. O número de agressores presos subiu 21,6% em 2022, na comparação com o ano anterior. Os dados são da Secretaria de Estado de Segurança Pública.
Violência recorrente
Joana tem 55 anos. Foi casada por 15 anos e durante todo esse tempo foi vítima de violência doméstica. A princípio psicológica e depois física.
Vivia machucada
Quando questionada pelos pais e pelos irmãos, dizia que tinha caído. A frequência era tanta que a família desconfiou, mas ela nunca assumiu ser vítima de violência doméstica. Aliado aos maus tratos, era traída com frequência, o que só aumentava a sua dor.
A mulher conta que só muitos anos após a separação tomou conhecimento de que as agressões poderiam ser denunciadas.
" A gente é criada na roça, casa muito nova. Aí não tem nem ideia que pode pedir ajuda e que apanhar não é comum. Cresce ouvindo que ruim com ele, pior sem ele e acredita", relata.
Marize é cabelereira. Encontrou seu príncipe encantado pela internet. A paixão foi avassaladora. A vida era cheia de emoções e as viagens eram constantes. Aquele que achava ser o seu grande amor a convidou para mudar de cidade com a promessa de que assumiria o seu filho, dando do bom e do melhor a ele.
Acreditando que realmente tinha tirado a sorte grande, a mulher se mudou, ficou encantada com os luxos oferecidos pelo novo companheiro, mas logo a ficha começou a cair
Ele passou a controlar a roupa que usava, as ligações e mensagens que recebia e a impedir as suas saídas. O encantamento acabou e ela decidiu fugir e voltar para o Espírito Santo. Para isso contou com a ajuda de terceiros, uma vez que não tinha mais renda própria e era 100% financeiramente dependente dele.
Hoje respira aliviada por ter se livrado do relacionamento abusivo, recomenda cautela às mulheres que começarem relacionamentos virtuais, mas conta que não desistiu do amor.
Eliane morava com o marido advogado e a mãe num bairro de Cachoeiro. Conta que demorou a perceber que o sonho do casamento perfeito estava virando pesadelo aos poucos.
O companheiro passou a agredí-la verbalmente e a gritar com ela inclusive em público. Passou a ter medo dele e fazia de tudo para não contrariá-lo, uma vez que qualquer coisa era motivo para agressões.
Ela conta que chegou a pedir ajuda à União Cachoeirense de Mulheres, mas foi orientada a denunciar, já que qualquer providência só poderia ser tomada a partir daí. Foi inclusive orientada a procurar o Centro de Referência Especializada da Assistência Social (Creas), que também acolhe e encaminha as vítimas, mas não deu tempo.
No mesmo dia em que buscou orientação, uma sexta-feira, à noite, ele chegou em casa muito alterado, jogando as panelas no chão. Com medo ela saiu com a mãe para a rua. Os xingamentos e ameaças foram tantos que os vizinhos, incomodados e solidários , a socorreram e chamaram a polícia e ele foi preso.
Estes casos apenas ilustram a situação de violência a que Joana, Marize e Eliane (nomes fictícios, histórias reais) e tantas outras mulheres do Espírito Santo e do Brasil são submetidas todos os dias.
O assunto precisa estar em pauta o ano todo, e não apenas na semana em que se comemora o Dia Internacional da Mulher, entende Elizângela Altoé, uma das fundadoras do Coletivo Vozes Feministas, de Cachoeiro.
"É preciso um envolvimento constante, de toda a sociedade, na luta contra a violência, que atinge todas as mulheres, independente de classe ou raça. A criação de uma rede de apoio é fundamental para a conscientização, o acompanhamento e a proteção dessas mulheres, elas precisam sentir que não estão sozinhas. É necessário e urgente envolver diferentes setores da sociedade nesta luta, a família, amigos, igreja, movimentos sociais e as associações de moradores, precisam colaborar para ajudar essa situação. E, por outro lado, é fundamental que o estado também cumpra seu papel, na construção de políticas públicas mais eficientes e eficazes, que protejam e empoderem a mulher em todos os âmbitos sociais, possibilitando que ela consiga romper com os ciclos de violência que a rodeiam.
Entra ano e sai ano, continuamos sendo mortas pelo fato de sermos mulheres.
Acredito que só com uma força farefa, vamos derrubar o patriarcado e o preconceito que está enraizado nas pessoas e na sociedade.
Basta de ódio e de desprezo.
Queremos Viver!"