O presidente do Irã, Ebrahim Raisi, ordenou nesta quinta-feira (6) a abertura de investigações sobre um confronto entre policiais e manifestantes que teria deixado dezenas de mortos na cidade de Zahedan, no sudeste do país. O caso ocorreu na última sexta (30), na esteira dos protestos que já duram três semanas em várias cidades da nação muçulmana.
Segundo Teerã, foram 20 mortos, incluindo seis policiais e o chefe regional da inteligência da Guarda Revolucionária -braço militar responsável por, entre outras coisas, conduzir operações no exterior.
A Anistia Internacional, porém, disse nesta quinta que 82 pessoas morreram, sendo 16 vítimas de confrontos em outras áreas de Zahedan -centenas ficaram feridas. A organização frisa que algumas pessoas morreram dias após o massacre devido aos baixos estoques de sangue, curativos e suprimentos médicos. Outras ainda estão gravemente internadas.
Segundo o órgão, as forças de segurança dispararam, do telhado de uma delegacia, "munição real e gás lacrimogêneo" contra manifestantes reunidos em frente ao local. "As provas colhidas mostram que a maioria das vítimas foi atingida por balas na cabeça, no coração, no pescoço e no tronco, revelando clara intenção de matar ou ferir gravemente."
A agência de notícias AFP, seguindo a retórica de organizações de direitos humanos, chamou o episódio de "Sexta-Feira Sangrenta" -referência direta a outros massacres, como os "domingos sangrentos" do Império Russo e da Irlanda do Norte e a "sexta sangrenta" da ditadura militar do Brasil. .
A mídia próxima ao regime iraniano descreveu os confrontos como "incidente terrorista", e Teerã acusou o grupo rebelde sunita Jaish al-Adl de estar por trás das mortes. O líder da minoria sunita na província de Sistão-Baluchistão -onde está Zahedan-, porém, rejeitou o envolvimento da organização. Segundo ele, na última sexta, "um grupo de soldados, a pé e em veículos, disparou contra pessoas reunidas ao redor de uma mesquita, matando e ferindo vários jovens".
A província, na fronteira com Paquistão e Afeganistão, é uma região pobre, onde com frequência ocorrem atentados e confrontos entre forças de segurança e grupos armados. A área abriga a minoria baluchi, que adere principalmente ao islamismo sunita, não ao xiismo dominante do Irã.
Militantes e ONGs há muito lamentam que a região sofra discriminação por parte do establishment religioso xiita, com um número desproporcional de baluchis mortos anualmente em confrontos com as autoridades ou condenados e executados. A Anistia estima que em 2021 ao menos 19% de todos os condenados à morte eram baluchis, ainda que a etnia represente menos de 5% da população do país.
O regime indicou em comunicado que o ministro do Interior, Ahmad Vahidi, foi ao local nesta quinta por ordem do presidente para liderar uma investigação sobre as causas da violência ocorrida.
O diretor da ONG Baluch Activists Campaign (BAC), Abdullah Aref, disse à AFP que na sexta os manifestantes foram à delegacia protestar e, no local, gritaram palavras de ordem contra o aiatolá Ali Khamenei. Alguns teriam atirado pedras nos policiais, que responderam com tiros. Segundo o ativista, "muitas pessoas foram mortas por franco-atiradores, incluindo pessoas que não participaram do ato".
A violência em Zahedan ocorre enquanto o Irã enfrenta uma onda de protestos após a morte de Mahsa Amini, uma jovem curda de 22 anos, ainda em 16 de setembro. Ela sob custódia da polícia em Teerã, após ter sido detida por supostamente não usar o véu islâmico como dita o rígido código de vestimenta do país. A família diz que ela foi espancada, mas as forças de segurança alegam um mal súbito.
Desde então, 154 pessoas morreram em manifestações, segundo a organização Direitos Humanos no Irã.