À medida que a variante ômicron avança no país, hospitais públicos e privados já registram aumento de diagnósticos e de atendimentos de crianças com Covid, além de leve tendência de alta em internações. Isso reforça a necessidade de vacinar esse público o quanto antes, segundo especialistas.
Nesta quarta (5), o Ministério da Saúde definiu que as crianças de 5 a 11 anos receberão a vacina da Pfizer para Covid-19 sem precisar apresentar prescrição médica. A vacinação nessa faixa etária não será obrigatória e deve começar ainda neste mês.
O temor dos especialistas é que o Brasil enfrente uma situação parecida com a dos Estados Unidos, que computa o maior número de internações de crianças com Covid desde o início da pandemia. Foram mais de 325 mil novos casos na semana passada, um aumento de 64% em relação à semana anterior.
Devido ao apagão de dados no sistema de notificação oficial do Ministério da Saúde e subnotificação de casos de estados e municípios, não há dados nacionais sobre a alta da Covid no público infantil, mas ela já é percebida em hospitais e consultórios médicos.
No Hospital Infantil Sabará, na capital paulista, os atendimentos de crianças até dez anos com Covid começaram a aumentar a partir da semana epidemiológica 50 (de 12 a 18 de dezembro). O número saltou de um caso semanal para 15 nas duas semanas seguintes.
A taxa de positividade nos testes de Covid nesse mesmo período passou de 2% para 20%. Na quarta (5), quatro crianças estavam internadas com Covid –na semana 50, havia uma.
No Hospital Albert Einstein, o índice de testes positivos para Covid em crianças passou de 8,6% na semana do Natal para 29% nesta semana. Nesta quarta (5), apenas uma criança estava internada com Covid.
No Hospital Sírio-Libanês, a taxa de positividade nos exames de Covid triplicou entre o início de dezembro e o começo de janeiro: de 7% para 21,4%. Duas crianças estão internadas.
Na rede pública, três hospitais infantis da capital paulista –Cândido Fontoura, Darcy Vargas e Menino Jesus– registram tendência de alta na ocupação de leitos para Covid.
Passaram de 29 internações, em meados de dezembro, para 40 nesta quarta (5), segundo análise do Infotracker, projeto da USP e da Unifesp que monitora a pandemia no estado.
Em nota, a Secretaria Municipal da Saúde informa que, nas últimas cinco semanas epidemiológicas, foram registrados em toda a cidade de São Paulo 33 casos de Srag (Síndrome Respiratória Aguda Grave, que pode ter o coronavírus como causa, além de outros patógenos) em crianças, mas não especifica a evolução desses números.
No maior hospital infantil do SUS, o Pequeno Príncipe, que fica em Curitiba (PR), o estado é de atenção. O número de casos confirmados triplicou no último mês. Foram quatro casos entre 1º e 4 de dezembro contra 12 no mesmo período deste mês.
Entre 10 de dezembro e 2 de janeiro, a instituição não tinha internada nenhuma criança por Covid. Na última segunda (3), foram duas (uma de oito anos e um bebê de dez meses).
Segundo Renato Kfouri, infectologista, pediatra e diretor da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações), a elevação de casos de Covid pela variante ômicron tem sido observada em todas as idades, mas tende a aumentar mais, proporcionalmente e em números absolutos, entre as populações não vacinadas, caso de crianças no Brasil.
"É o fenômeno do desvio proporcional. Começamos vacinando idosos [e os casos de Covid caíram nessa população], aí o vírus começou a pegar mais adultos jovens e, agora, o desvio natural é pegar as crianças não vacinadas", explica.
Ele diz que, nos Estados Unidos, crianças e adolescentes menores de 18 anos representavam menos de 1% dos infectados no início da pandemia. Agora, são 23%. Houve 1.045 mortes nessa faixa etária por Covid desde o início da pandemia. No Brasil, são 2.178 mortos com menos de 18 anos.
"As crianças raramente precisam ser internadas por Covid, mas 1% de 100 mil casos, de 1 milhão de casos, é muita criança hospitalizada. Nos Estados Unidos, está todo mundo muito preocupado. E aqui é a mesma coisa. A gente está meio às cegas com dados oficiais, mas vê esse aumento nos consultórios e prontos-socorros."
De acordo com Wallace Casaca, coordenador do Infotracker, com o apagão de dados sobre internações por Covid e a falta de testagem, está muito difícil saber a real dimensão de crianças infectadas e internadas.
Presidente não reconhece mortes
Apesar do quadro alarmante, que tem aumentado o contágio em crianças, já registradas mais de 300 mortes em todo o país, o presidente Jair Bolsonaro (PL), em entrevista concedida à Rádio Nordeste, de Pernambuco nesta quinta-feira (6), logo após o Ministério da Saúde anunciar a vacinação para crianças de 5 a 11 anos, disse nesta quinta-feira (6) desconhecer criança que tenha morrido por Covid-19, repetiu efeitos colaterais da imunização e pediu que pais não se deixem levar pelo que chamou de propaganda.
"A própria Anvisa que aprovou também diz lá que a criança pode sentir, logo depois da vacina, falta de ar e palpitações. Eu pergunto: você tem conhecimento de uma criança de 5 a 11 anos que tenha morrido de Covid? Eu não tenho", disse o presidente.